A Marcha das Vagabundas

O que leva pessoas de lugares tão diferentes como São Paulo e Belo Horizonte, no Brasil, Chicago e Los Angeles, nos EUA, Edmonton, no Canadá, Estocolmo, na Suécia, Amsterdã, na Holanda, e Edimburgo, na Escócia, a saírem em passeata nas ruas? Respeito: essa é a bandeira da Slut Walk, ou Marcha das Vagabundas, evento que está mobilizando mulheres do lado de cima e do lado de baixo da linha do Equador.

Talvez você já saiba como tudo começou, mas não custa relembrar rapidamente: durante uma palestra sobre segurança no campus em uma universidade em Toronto, no Canadá, um policial disse às alunas que elas evitariam estupros se não se vestissem como vadias. A indignação levou a uma passeata que reuniu cerca de 1000 mulheres e também a uma identificação com o tema que está gerando protestos em vários países, rompendo a tradicional divisão entre países ricos e pobres, católicos e protestantes, conservadores e liberais. Porque apesar das diferenças de clima, economia, religião ou inclinação política, a discriminação contra a mulher existe em todos eles.

E o que chama a atenção na Marcha das Vagabundas é que sequer chegamos ao estágio de exigir remuneração equivalente por um mesmo trabalho ou a criação de estruturas de apoio à criação dos futuros cidadãos, tarefa que permanece totalmente no âmbito doméstico e, dentro dele, sob responsabilidade da mulher – que, desta forma, é obrigada a assumir duplas ou triplas jornadas de trabalho. Estamos exigindo apenas respeito. E proteção. Porque não se trata apenas de ter que suportar investidas inapropriadas e cantadas de mau gosto – embora estes dois itens, por si só, já sejam mais que suficientes para uma marcha de protesto! Trata-se, muitas vezes, de intimidação e agressão. Assédio sexual. Em casos extremos, estupro. E violência, seja ela física ou moral. Pior: sob o atual machismo, a vítima é vista como culpada – qualquer detalhe, como roupa ou cabelo ou o “jeito como falou” e já se assume que “ela pediu”.

Não, não pedimos. E a importância da Marcha das Vagabundas é mostrar que a culpa pela violência sexual não é da vítima.

Quando usamos minissaia, roupas transparentes, decotes, maquiagem ou perfume, queremos ser e parecer bonitas. Também há as que não se importam com isso e tudo bem: cada um tem o direito de se relacionar com seu corpo do jeito que achar mais conveniente. Ou melhor, do jeito que for mais condizente com a personalidade, a história de vida, os objetivos e o gosto da pessoa. E é óbvio que o desejo surge: é natural que certas pessoas o despertem em você. Mas nem por isso você vai ser inconveniente em sua abordagem. Muito menos obrigar o outro a responder ao seu desejo. Porque desejar é natural, mas não implica obrigatoriamente em reciprocidade. Você ser desejado por alguém que você não deseja. Assim como pode desejar alguém que também não te deseje. Encontros e desencontros fazem parte da vida.

O que não faz parte é impor a vontade a qualquer custo. Porque na relação de desejo homem-mulher, esta última sempre sai perdendo - e, muitas vezes, o que ela perde é a vida, como vemos todos os dias no noticiário. Ainda há mulheres que são estupradas por que a roupa que usam desperta o desejo – e até pouco tempo, era obrigação da mulher satisfazer o desejo do homem. Aliás, ainda é, em alguns lugares do mundo: em 2009 o parlamento do Afeganistão aprovou uma lei que obriga as mulheres a fazer sexo com seus maridos sempre que eles quiserem.

Entre o sexo forçado e a violência, não há´distinção: as cicatrizes ficam, sejam elas físicas ou emocionais. E não são poucas: de acordo com estimativa da Anistia Internacional e da Organização Mundial de Saúde (OMS), 1 em cada 3 mulheres já sofreu violência, que é a maior causa de morte nas que têm entre 16 e 44 anos. Calcula-se que 70% dessa violência vêm ocorrendo dentro do ambiente familiar. O mais grave é que cerca de 60% dessas mulheres sentem medo e constrangimento. Por isso, sofrem caladas, sem tomar qualquer tipo de atitude para sair do círculo da violência. Pesquisa Percepções sobre a Violência Doméstica contra a Mulher no Brasil, realizada em fevereiro de 2009 pelo Ibope/Instituto Avon, com planejamento e supervisão do Instituto Patrícia Galvão, mostrou que 55% dos entrevistados conhecem casos de agressões a mulheres, 56% apontam a violência doméstica como o problema que mais preocupa as mulheres, 78% afirmam conhecer a Lei Maria da Penha e 44% acreditam que ela já está fazendo efeito.

  • Um em cada 5 dias de falta ao trabalho no mundo é causado pela violência sofrida pelas mulheres dentro de suas casas.
  • A cada 5 anos, a mulher perde 1 ano de vida saudável se ela sofre violência doméstica.
  • O estupro e a violência doméstica são causas importantes de incapacidade e morte de mulheres em idade produtiva.
  • Na América Latina e Caribe, a violência doméstica atinge entre 25% a 50% das mulheres.
  • Uma mulher que sofre violência doméstica geralmente ganha menos do que aquela que não vive em situação de violência.
  • No Canadá, um estudo estimou que os custos da violência contra as mulheres superam 1 bilhão de dólares canadenses por ano em serviços, incluindo polícia, sistema de justiça criminal, aconselhamento e capacitação.
  • Nos Estados Unidos, um levantamento estimou o custo com a violência contra as mulheres entre US$ 5 bilhões e US$ 10 bilhões ao ano.
  • Segundo o Banco Mundial, nos países em desenvolvimento, estima-se que entre 5% a 16% de anos de vida saudável são perdidos pelas mulheres em idade reprodutiva como resultado da violência doméstica.
  • Um estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento estimou que o custo total da violência doméstica oscila entre 1,6% e 2% do PIB de um país.
Outros textos que podem lhe interessar:

Um comentário:

  1. Bem interessante esse seu post.
    Apesar de nao gostar do titulo do protesto como marcha das vagabundas, acredito que ainda exista muita violencia contra a mulher e isso é um cancer pra sociedade.
    A violencia contra a mulher é um marco aqui na Italia aonde moro tambem.Homem que mata mulher quando nao os filhos juntos e se suicida.

    Ao mesmo tempo temos a mulher brasileira que aqui se submete a tudo,ainda faz sexo com os caras,é chamada de prostituta e faz cara de simpatica.

    Acredito que o papel de responsabilidade da mulher na sociedade é unico, visto ela assim como podendo ter o homem que quiser, saber se valorizar e educar o filho.Quem é de paises com exterotipos formados negativamente,sofre o dobro.

    Aqui ja vi o funk dança de bunda na TV italiana e me senti envergonhado de ter ainda mulher desse tipo que faz apologia ao que a maioria diz detestar confundindo criticas legais com preoconceito e machismo.

    Parabéns.
    Druida

    ResponderExcluir

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...