Não é o trânsito que mata. São as pessoas.

Cresci ouvindo a expressão “trânsito mata”. E como! Na última década, o número de jovens mortos no trânsito brasileiro subiu 32,4%, segundo o mapa da violência do Ministério da Justiça. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o índice de mortes no trânsito em nosso país é três vezes maior do que o considerado aceitável: são 18,3 por 100 mil habitantes a cada ano, segundo a instituição. Na Alemanha, Grã-Bretanha, Holanda e Suíça, que estão entre os países com os menores níveis de mortalidade no tráfego, o índice é inferior a 6. Ainda de acordo com a OMS, os acidentes de trânsito matam mais que a Malária e a AIDS.


Na raiz desta verdadeira epidemia, vários fatores: estradas e ruas esburacadas e mal iluminadas, sinalização precária e muita, muita irresponsabilidade. Beber e dirigir, por exemplo – até o Senador Aécio Neves recusou o teste do bafômetro! Como se tal recusa fosse aceitável! Pode até ser juridicamente, mas nunca do ponto de vista ético ou moral. Passar farol vermelho, fechar, cortar, entrar em uma avenida sem olhar: hoje mesmo uma linda moça de negros cabelos lisos e óculos de grife fez o favor de jogar sua caminhonete Toyota reluzindo de nova em cima do meu carro! A sorte é que não havia ninguém na faixa da esquerda, senão o desvio que fui obrigada a fazer fatalmente resultaria em uma colisão.

Agora, imagine se eu estivesse de moto. Ou de bicicleta. Aliás, nem precisa imaginar: no começo de junho, um louco arrastou uma moto em uma cidade no interior de São Paulo, gerando comentários – pasme! – favoráveis nas redes sociais!


No começo de maio deste ano, a ciclista Laura Sobenes registrou em vídeo e em texto no Facebook a agressão sofrida por um motorista de ônibus. Ela pedalava na Avenida Paulista quando um ônibus a fechou na Paulista. Ela parou para conversar com a pessoa ao volante que, surpreendentemente (ou talvez nem tanto, ficou agressivo e jogou o ônibus em cima dela. Ao parar novamente do lado, ela perguntou ao condutor: "cara, pra quê isso?" e ouviiu como resposta a seguinte pérola: "ué, toma cuidado. É você que vai morrer. Eu só vou assinar um B.O."

Discussão com motorista de ônibus na Av. Paulista from Laura Sobenes on Vimeo.

Pois é. Só um B.O. Não se trata apenas da evidência crua da falência de nosso sistema judicial. Trata-se da falência de nossa sociedade. Quando deixamos de reconhecer no outro um ser humano, quando a pintura ou a lataria do nosso carro se torna mais importante que uma vida,, o resultado é a barbárie – não por acaso, a palavra que hoje melhor descreve nosso trânsito. E que fez hoje mais uma vítima inocente.

E pensar que no TeDx Vila Madá, a Renata Falzoni defendeu que “só bike salva”.



Meus sinceros pêsames à família de Antonio Bertolucci. Como todas as demais vítimas do trânsito, ele não merecia.

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