Setor de aviação teme Copenhagen

Em seu discurso no encontro anual da Associação Internacional de Transporte Aéreo em Kuala Lumpur, na Malásia, Willie Walsh, presidente da British Airways disparou: se o setor não apresentar uma proposta de trabalho para reduzir suas emissões de CO2, ele poderá ser enquadrado na Conferência Mundial do Clima, que acontece em dezembro deste ano em Copenhagen, Dinamarca – e que traçará novas metas de redução na emissão dos gases que provocam o efeito estufa.

Resumidamente, a história é a seguinte: o setor de aviação só ficou de fora das metas do Protocolo de Kyoto porque prometeu que traçaria um plano de ações para se auto-regulamentar, o que não aconteceu, apesar de mais de uma década de conversas e negociações. Agora, a seis meses da Conferência do Clima de Copenhagen, eles ainda não têm nada para apresentar.

Ocorre que o mercado de aviação é um dos mais regulados do mundo. Óbvio: qualquer acidente é uma catástrofe, como acabamos de ser lembrados pelo desastre da Air France. Por isso, eles têm várias entidades e instâncias de segurança e normas. Só que são entidades burocráticas, com suas próprias idiossincrasias, seus ritos e seus ritmos peculiares – sinônimo de uma agenda nada amigável. Para você ter uma idéia, a próxima reunião da Organização Internacional de Aviação Civil (ICAO) , que é o organismo da ONU que representa as linhas aéreas e que até agora não desenhou uma proposta para o setor, só se reunirá em outubro. Too late, como Mr. Walsh concluiu.

Agora, a esperança das companhias aéreas é a toda-poderosa IATA, Associação Internacional de Transporte Aéreo, o sindicato patronal deles, que representa 230 companhias aéreas responsáveis por 93% do tráfego aéreo mundial. Walsh virou a metralhadora contra a ICAO, questionando sua legitimidade de representar o setor em Copenhagen e conclamando para que a IATA faça essa intermediação. E o trabalho de construção de legitimidade deste interlocutor já começou: hoje mesmo, no site da Conferência, a entidade divulgou uma proposta setorial, que consiste na neutralização das emissões de CO2 com base em melhores tecnologias, aviões mais eficientes e disseminação do uso de biocombustíveis, entre outras medidas. Junto, a IATA já avisou que participar dos mecanismos de negociação de carbono custará ao setor US$ 7 bilhões ao ano a partir de 2020, usando como base a cotação de US$ 65 por tonelada de carbono, e que os custos serão repassados aos passageiros.

Até que ponto há efetivamente uma proposta do setor aéreo ou tudo não passa de jogo de cena para tentar ficar fora das novas metas? Pegando apenas a questão dos biocombustíveis na aviação: havia um painel sobre o tema previsto na programação do Ethanol Summit, que aconteceu entre os dias 1 e 3 de junho aqui em São Paulo. Pois bem: o painel caiu por falta de palestrante. Outro indicativo que preocupa é a ênfase na questão do lobby que permeou a fala de Mr. Walsh em Kuala Lumpur: “fazer-se ouvido”, “temos que nos representar”, “temos que fazer algo para que ouçam nossa voz”. Ele chegou a fazer um mea culpa público porque o setor concentrou seu lobby nos ministros dos transportes de seus respectivos países, e não nos ministérios e departamentos ambientais.

Pois é, não é por acaso que o número de lobbistas lidando com questões climáticas cresceu 300% nos últimos cinco anos nos EUA. Ok, o diálogo integra o DNA da democracia e o lobby é seu instrumento válido e legítimo. Porém, a atividade tem este nome justamente porque quando surgiu, no Parlamento Inglês, só era permitida na recepção do prédio (em inglês, lobby), diante de todos, para assegurar a transparência do processo.

Pelo que tenho lido sobre Copenhagen, parece que há um endurecimento de posições, tanto de setores econômicos, como de países - o bom e velho criar dificuldades para negociar facilidades. Por isso, a participação de todos nós é muito importante. Com a internet, estamos a apenas um clique do site oficial da Conferência, da IATA, do governo norte-americano ou do Itamaraty. Ah, sim, e da imprensa! Não deixe de cobrar uma posição mais clara e firme no trato da questão ambiental: faça-se ouvir você também!

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