Amazônia: ponto de ruptura acontece em 4 anos

Acredito firmemente que relacionar sustentabilidade a algo que não esteja próximo de nossas vidas é uma armadilha para deixarmos tudo como está. Mas embora fique a quilômetros de distância, a Amazônia tem, sim, a ver com a nossa vida: ela é uma âncora climática que segura os padrões de chuva e temperatura no mundo todo. Ela é também uma fonte de inúmeros recursos econômicos. É, ainda, um celeiro de diversidade social e cultural cuja integração está por acontecer.

Essa percepção tornou-se mais aguda depois de ler a entrevista do Adalberto Veríssimo, um dos fundadores do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), publicada na edição de final de semana do Valor Econômico (agradeço ao José Eli Veiga pelo envio do material). Abaixo resumo os principais tópicos destacados na matéria:

I - O problema:

· A grande Amazônia tem 8 milhões de km2, dos quais 5 milhões estão no Brasil.
· Ela responde por 8% do PIB e 55% dos gases de efeito estufa emitidos pelo Brasil.
· 900 mil km2 (= uma Venezuela), ou 15% do total já foram desmatados. Desse total, 730 mil km2 estão do lado brasileiro da floresta.
· Por ano se extraem cerca de 24 milhões de metros cúbicos de madeira, o equivalente a 6 milhões de árvores (nesse processo danificam-se outros 4 milhões de árvores, que não são necessariamente derrubadas, mas cuja vida fica comprometida).
· Quando atingirmos 30% de área desmatada, o processo de degradação será irreversível – ou seja, a partir daí não adiantará de nada parar de desmatar porque a floresta entrará automaticamente em colapso, pois seu mecanismo de recuperação terá sido destruído. Em termos técnicos, isso se chama ponto de ruptura.
· Esse ponto deve ser atingido daqui a 4 anos.

II – O ciclo econômico que gera o desmatamento

· A exploração econômica da Amazônia baseia-se na abertura de fronteira permanente, como se não houvesse limites.
· Ela começa com a tomada de posse de uma grande área, cuja floresta é derrubada para gerar o caixa necessário para se instalar a infra-estrutura de ocupação. Ocorre que o solo da Amazônia varia muito: salvo em lugares de minérios ou de terra com composição química adequada ao plantio (de pastagens ou grãos), a atividade implantada não se sustenta e a riqueza acaba quando a madeira acaba.
· Quando a área fica degradada, o agente econômico muda-se para uma nova fronteira de desmatamento, deixando para trás um município falido, sem renda ou emprego, que se torna totalmente dependente dos programas do governo.

III – Os entraves à produção sustentável

· A produção de madeira manejada na Amazônia representa apenas 10-15% do total.
· Um dos principais motivos para o baixo uso da produção manejada é que ela exige áreas legalizadas e 53% do território da Amazônia Legal não tem uma definição clara de quem é o dono (dos 47% restantes, 43% são áreas protegidas).
· A questão fundiária depende de Brasília e o Governo Federal: 1) não finalizou um zoneamento econômico-ecológico desse bioma que dê suporte às políticas para a região, portanto ele trata coisas diferentes com uma mesma medida; 2) não considera a região uma prioridade – tanto que o Plano Amazônia Sustentável, lançado em maio do ano passado, não decolou por falta de verba. A área econômica do governo só vê a Amazônia como prioridade nos investimentos dentro do plano de geração de energia. Nesse vácuo, a Bancada Ruralista age obtendo autorização para desmatamentos crescentes.
· O zoneamento econômico-ecológico é importante para que se saiba o que é preciso preservar e onde dá para ter atividade econômica. Em áreas de ocupação expressiva, faz mais sentido intensificar a atividade econômica do que reflorestar, inclusive como forma de reduzir a pressão por mais desmatamento.

IV – O ciclo de degradação da floresta

· Começa com a exploração madeireira e o corte das árvores, das de maior valor para as de menor valor.
· Como essas áreas de exploração ficam perto de pastagens, elas em seguida são invadidas pelo fogo que, nesse estágio, é rasteiro, ou seja, não consome as árvores e, portanto, não é detectado pelos satélites. Esse fogo mata as raízes das árvores, as sementes e mudas do solo, ou seja, a próxima geração da floresta.
· A recuperação fica comprometida por conta da maior quantidade e tamanho das aberturas pelas quais entra o sol (geradas pelo desmatamento), as quais intensificam o processo de ressecamento do ambiente.
· A partir deste ponto de pouca umidade e baixo estoque de sementes e mudas, a floresta não consegue se recuperar e entra em colapso, mesmo que não haja mais desmatamento.

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