A sustentabilidade da energia nuclear

A história de como a humanidade encara a energia nuclear é um exemplo de conduta não sustentável por parte de todos os atores envolvidos, de governos a organizações não governamentais.

Baseio minha afirmação em um histórico de defesas e acusações apaixonadas, quase ideológicas, e que se repete hoje, quando ela é simplesmente descrita como a melhor fonte de energia para enfrentarmos o aquecimento global. De grande vilã a salvadora da humanidade, o que há é uma notável uma ausência de maturidade para encarar a questão do risco inerente a esta atividade. Mesmo depois de Chernobyl, nota-se que o risco ambiental das usinas nucleares ainda é percebido como algo que pode ser gerenciado apenas por meio de procedimentos de operação. Eles são fundamentais, sem dúvida! Mas a gestão de risco, para ser mais eficaz, precisa começar antes: mais especificamente, na definição do projeto.

Análise de ciclo de vida do produto e eco-engenharia podem reduzir muito o impacto ambiental de qualquer atividade produtiva. Tanto que é exatamente a atualização tecnológica que o governo inglês invoca para convencer a população da Grã-Bretanha a aceitar a instalação de novas usinas após a identificação do desastre provocado pelas já existentes. Porque atualmente é na ilha do fog e do chá das cinco que se encontra o site mais contaminado da Europa ocidental.

Trata-se de Sellafield, na Cumbria (região nordeste na Inglaterra), onde quantidades enormes de lixo radioativo encontram-se em um edifício que não oferece condições de segurança mínimas para evitar a contaminação. A origem deste desastre silencioso remonta a 1972, quando uma greve de mineiros afetou o fornecimento de energia na ilha (o carvão respondia, naquela época, pela quase totalidade da matriz energética da Grã-Bretanha). Para compensar, a usina passou a trabalhar em carga total, gerando resíduos que não tinham como ser gerenciados – e que foram simplesmente jogados na água de resfriamento para desintegrar. A desintegração aconteceu, mas ela não eliminou a radiação: apenas criou o que pode ser descrito como um esgoto tóxico que emite doses potencialmente letais de radiação.

Mas não se trata apenas de um altíssimo risco ambiental e humano. Sellafield é também um enorme passivo financeiro para o contribuinte bretão, que terá que desembolsar 500 milhões de libras em impostos ao ano para financiar um projeto de recuperação que, segundo estimativas de especialistas, poderá custar 50 bilhões de libras (algo como R$ 156 bilhões) nos próximos 100 anos.

São números como estes que obrigam a questionar o atual modelo de avaliação de custo de projeto, focado apenas no investimento inicial – e que tem sido o principal impedimento à expansão de energias limpas, como eólica e solar.

Bom, estas são as notícias que os britânicos estão encarando no mesmo momento em que o governo avalia 11 locais que poderão vir a abrigar novas usinas. O argumento oficial é que a tecnologia hoje é muito mais eficiente e limpa. E é aí que o problema sai do lado de lá do Atlântico e atinge nossas praias. As de Angra dos Reis, para ser mais específica. Pois, como a Folha de S. Paulo informou em sua edição de hoje que o Governo vai retomar o projeto de Angra 3 revalidando a concorrência ganha pela Andrade Gutierrez em 1983.

Mas se a matéria questiona a legitimidade de retomar uma obra deste porte sem uma nova licitação, mais uma vez fica a lacuna sobre a gestão de risco dessa obra. Porque uma licitação de 1983 significa um projeto de 1983. Seria o mesmo que pedir a uma montadora que implantasse uma linha de produção da década de 80, a qual gerava automóveis muito mais poluentes que hoje.

Face ao custo que se pode ter no futuro para recuperar uma área ocupada por uma usina nuclear, não faria mais sentido rever agora o projeto em busca de alternativas mais seguras, eficientes e limpas?

Pode até ser que a energia nuclear seja mesmo a melhor alternativa para impedir o avanço nas emissões dos gases causadores do efeito estufa. Só que a forma como ela tem seu risco gerenciado é preocupante.

Informações do The Guardian. Imagem de Sellafield, Inglaterra. Foto Alamy, Cumbria.

3 comentários:

  1. muito bom esse asunto sobre a sustentabilidade e a enegia núclear

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  2. é muito bom ter uma pagina na internet que falar sobre um assunto tão importante que é a energia nuclear e sustentabidade.

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  3. excelente...






    ...merda!!!

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