Sugestões para um glossário de sustentabilidade

Acredite: ainda hesito quando alguém me pergunta o que é sustentabilidade. Sendo profissional da área de comunicação, isso me incomoda profundamente. De onde vem essa inabilidade de comunicar de maneira simples e clara o que é sustentabilidade, sem ter que recorrer a palavrões em inglês como stakeholder, accountability ou tripple bottom line?

Poucas coisas estão tão intrinsecamente ligadas a poder e dominação como a linguagem. Ainda crianças, somos introduzidos em seu contexto mágico nas brincadeiras de Abracadabra. Mais tarde, descobrimos como ela diferencia socialmente por meio das gírias e expressões das diferentes tribos, do sotaque regional ou do falar diferenciado entre classes sociais, como Bernard Shaw sarcasticamente nos mostra em Pigmalion, adaptado para o cinema e o teatro como My Fair Lady. A linguagem chega a justificar profissões como a dos advogados, que muitas vezes são contratados apenas para verter para o juridiquês aquilo que, em simples português, não garante nosso direito.

Por meio da linguagem, incluímos ou excluímos pessoas e grupos. Para incluir, é preciso que os conteúdos sejam compartilhados, ou seja, do conhecimento de muitos. Para excluir, basta complicar. E o Brasil tem tradição no uso da linguagem excludente como sinônimo de cultura e status social. Basta lembrar do Rui Barbosa, o Águia Haia, louvado por... falar difícil! Essa tradição maldita se instalou na classe política e entre os pseudo-intelectuais e pedantes de plantão – infelizmente, graças ao apoio e ao aplauso da massa semi-analfabeta que aprova a prática da exclusão como sinônimo de ascensão social. Ou você acha que essa tradição teria vingado se o povo jogasse tomate e ovo nos biltres que não se comunicassem direito??

Voltando à sustentabilidade: tem tanta gente grande e boa nessa área – por que a dificuldade em comunicar? A resposta-padrão é que o conceito está em construção. Ok, mas isso compromete a apresentação de um conceito final, não de um conceito simples e fácil de ser apreendido. O motivo, portanto, deve ser outro – e a partir daqui eu me calo a respeito, porque não tenho evidências que sustentem (com o perdão do trocadilho) qualquer teoria. Apenas prossigo no enfrentamento do desafio proposto, de comunicar sustentabilidade. Para tanto, dou o pontapé inicial com algumas sugestões, todas passíveis de críticas e melhoras, é óbvio:

1) Sustentabilidade = responsabilidade, ou seja, é quando levamos em conta a consequência que nossos atos têm sobre outras pessoas ou sobre o mundo e assumimos que somos parte da causa / do problema... e, portanto, temos que nos comprometer com a solução. Já está na hora de nos sentirmos envolvidos com esta questão como direito (direito ao futuro, direito à vida de nossos filhos, direito à qualidade de vida etc.) e como dever (de reduzir o consumo, de buscar formas de reciclar nosso lixo, de cobrar políticas ambientais e sociais mais sustentáveis etc. etc.).

2) Stakeholder = parte (interessada, envolvida, atingida, afetada).

3) Tripple bottom line = pessoas, ambiente, negócios.

4) Accountability = prestação de contas transparente / com transparência.

5) Engajamento = envolvimento, participação.

6) Materialidade = relevância; material = relevante.

Não quero fazer coro com o Aldo Rebelo – longe disso! O português enriqueceu-se absorvendo termos de outras línguas! – mas às vezes faz-se necessário optar pela última flor do Lácio para nos fazermos compreendidos. Por mais que soe estranho, acredite, tem gente que não sabe o que é “sale”, “off” – e as vitrines que usam estas palavras querem intencionalmente afastar quem não as conhece. Em bom português, isso se chama discriminação. Não é o que queremos para a sustentabilidade, não é verdade? Afinal, para esse troço ir para a frente, precisamos da adesão de todos, de A a Z, como diria a campanha daquele multivitamínico.

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