Desafios da CoP19


A fria Varsóvia deve receber, no final de 2013, mais uma morna etapa de negociações sobre o aquecimento global. O que podemos e devemos esperar da CoP19?

Desde o desfecho da CoP15, todas as Conferências falharam na principal missão de definir ações, meios e metas de mitigação das causas e equacionamento dos impactos de mudanças de clima, com chances de limitar o aquecimento médio na temperatura do planeta abaixo dos dois graus centígrados. Não importa o que Ban Ki Moon, Christiana Figueres ou a rainha da Inglaterra venham a dizer. A verdade nua e crua é que temos colhido um fracasso atrás do outro, quando consideramos aquilo que a ciência diz ser necessário. O simples passar do tempo reduz nossas chances de ação e eleva o tamanho da conta - tanto em custos financeiros, como ambientais e humanos. Mas nem tudo são perdas: estes quase 20 anos de negociações foram cruciais para a gênese de uma ainda incipiente noção de cidadania planetária. É ela que orienta muitas das ações das ONGs ambientais e sociais que acompanham as negociações climáticas, como o Vitae Civilis, de conscientização sobre o fato básico de que habitamos um mesmo planeta e que é dele e de seus habitantes como um todo que temos que cuidar - e não do interesse setorial desta ou daquela atividade econômica, deste ou daquele país.
A lenta gestação de uma cidadania planetária tem se dado em debates turbulentos que favorecem a polarização e o embate: quase tudo no regime da CoP pode ser usado para gerar embates, da justa classificação entre nações desenvolvidas e em desenvolvimento ao princípio da Convenção de responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Poderá um novo trilho de negociações, a Plataforma Durban, aproximar países e eliminar o atual clima de desconfiança e ceticismo entre as partes?

A lenta gestação de uma cidadania planetária tem se dado em debates turbulentos que favorecem a polarização e o embate: quase tudo no regime da CoP pode ser usado para gerar embates, da justa classificação entre nações desenvolvidas e em desenvolvimento ao princípio da Convenção de responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Poderá um novo trilho de negociações, a Plataforma Durban, aproximar países e eliminar o atual clima de desconfiança e ceticismo entre as partes? Será que a economia vai se transformar e adaptar na direção de um mundo sustentável ou o atual modelo e interesses hegemônicos prevalecerão, buscando formas de “esverdear” suas atividades?
Essa resposta depende mais do que será feito efetivamente, do que daquilo que for colocado na mesa de negociações. Porque as delegações dos países em desenvolvimento chegarão à CoP19 com um histórico consistente de promessas não cumpridas pelos países desenvolvidos. Sem opção e totalmente dependentes de uma liderança por parte dos países desenvolvidos que nunca se efetivou, salvo para manter o ritmo dos trabalhos em banho-maria, os negociadores das pequenas nações insulares, dos países menos desenvolvidos e do grupo africano, apenas para citar alguns, precisam de ações concretas para superar o justificado ceticismo que mina a flexibilidade necessária em um processo tão amplo e complexo.
E se o restabelecimento da confiança está diretamente ligado ao aumento do comprometimento e ambição em todos os tópicos da negociação - níveis de mitigação, recursos financeiros, transferência de tecnologia, capacitação etc. - estes, por sua vez, dependem de parâmetros aceitos pelas partes para mensuração, avaliação e relato, tanto das iniciativas de mitigação nas emissões, como da parte financeira. A falta de tais critérios tem aberto espaço a práticas questionáveis tanto por parte dos países desenvolvidos, como pelas nações em desenvolvimento, e é um fator com alto potencial de alavancar desconfiança. Em algum momento, a questão da exportação da poluição terá que ser enfrentada porque o crescimento das emissões em países como China, Índia e Brasil reflete, em parte, a produção destinada a nações desenvolvidas, que transferiram seus parques fabris obsoletos e atividades produtivas de alta intensidade no uso de recursos naturais e degradação socioambiental para alcançar suas metas de mitigação. Princípios e métricas que ajudem a definir o conceito de equidade serão igualmente fundamentais para gerar confiança no médio e longo prazos.
A exemplo de Cancun, em 2011, Varsóvia também receberá o desafio de criar um clima favorável às negociações. Nesse sentido, o primeiro passo deve ser em relação à própria condição de Presidência da CoP19: o radicalismo da delegação polonesa em relação à continuidade do "hot air" foi um dos principais problemas enfrentados pelo trilho de negociações sobre o segundo período de compromisso do Protocolo de Quioto e suscitou muitas dúvidas sobre o real comprometimento do país com o combate às mudsnças climáticas.
A CoP19 deve buscar a definição de um trilho claro para os compromissos financeiros antes de 2020, quando deve vigorar o novo acordo global. Os chamados "bunkers" (setores altamente poluidores, como aviação e navegação) devem ser endereçados em 2013 de forma mais concreta. A operacionalização do Fundo Verde de Clima não pode passar de 2013. A CoP19 deve também perseguir as metas de mitigação necessárias para que as emissões dos gases de efeito estufa comecem a declinar de 2015 - data-limite, segundo os cientistas, para manter a temperatura terrestres em limites suportáveis. Consultas em relação aos Planos Nacionais de Mitigação devem ser conduzidas para favorecer sua implementação e os mecanismos tecnológicos também preciso estar operacionais de 2013 em diante.
É no próximo ano que teremos uma ideia mais clara do que a Plataforma Durban poderá nos entregar: ações efetivas ou apenas mais conversa e postergação. Cumpre destacar que o mundo não aguentará mais essa gradual e lenta busca de processos de neogciação para um dia estabelecer futuras ações. Em vez da diplomacia processual, precisamos de diplomacia de resultados, o que sinalizaria vontade política e empenho de resolver os grandes dilemas humanitários, incusive os de ordem ambiental e economica.
Que o espírito libertário que inspirou os trabalhadores poloneses a questionar o autoritário regime comunista ilumine os negociadores a não se submeter, uma vez mais, à ditadura do business as usual.

texto publicado originalmente no boletim Vitae Civilis Informa e no site http://www.vitaecivilis.org.br/index.php/br/temas/clima/contribuicoes-do-vitae-civilis-ao-debate/vitae-civilis-na-cop-18/noticias-da-cop-18/437-desafios-da-cop19

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