O Acordo de Copenhague pode funcionar?

92 países já aderiram ao Acordo de Copenhague. Juntos, eles respondem por 80,6% das emissões globais. Então, se todos cumprirem as metas apresentadas, conseguiremos reverter a atual tendência de aquecimento do planeta?

Para Gaines Campbell, especialista em clima do Vitae Civilis que acompanhou a CoP15 até o último minuto, não. Segundo ele, as metas são muito tímidas e apontam para um aumento médio da temperatura do planeta em torno de 4 graus centígrados.

Mas para o Trevor Houser, que acaba de deixar o time de negociadores dos Estados Unidos para voltar ao Peterson Institute for International Economics, as metas apresentadas podem, sim, ficar dentro do limite de 2 graus estabelecidos pelo Acordo como teto para o aumento da temperatura do planeta. Ele fez um estudo cheio de tabelas, gráficos e condicionantes: "se" cumprirem, "se" continuarem depois de 2020, "se" o crescimento das nações em desenvolvimento... Ao ler esse "estudo", foi inevitável me lembrar do texto postado pelo Tão Gomes Pinto no blog dele sobre pesquisas eleitorais, no qual ele mostra como é possível manipular os números, mesmo seguindo rigorosamente a metodologia.

Mas o que me chamou mais a atenção foi o fato de um ex-membro da delegação norte-americana ter se dado ao trabalho de defender o Acordo de Copenhague depois do líder dessa mesma delegação ter torpedeado a UNFCCC, como relatamos neste blog. Depois de terem tido participação relevante no fracasso da CoP15. Em meio a um crescente enfraquecimento dos democratas que talvez inviabilize a aprovação de uma legislação ambiental pelo Congresso Americano (sem a qual será impossível que os EUA se comprometam com qualquer acordo internacional de cunho vinculante). Qual a intenção por trás de um exercício de imaginação tão claramente fabricado?

Bom, obviamente tem uma mensagem direcionada ao eleitor democrata preocupado com o meio ambiente (e as ONGs e os formadores de opinião do segmento): não perdemos a viagem, o que fizemos em Copenhague vai segurar a onda do aquecimento global. Existe, certamente, um recado para o Congresso: o que prometemos lá fora é suficiente e não vai comprometer nossa competitividade, nem nossos empregos, podem votar a legislação ambiental! E talvez não exista mais que isso, considerando-se o umbigocentrismo dos EUA.

Mas é inevitável ver nesse "estudo" um outros recados: o de que um acordo não vinculante pode funcionar, que basta focar em mitigação... Ou seja, esqueça o Mapa de Bali! Para quê gastar dinheiro com transferência de tecnologia? Adaptação? Para quê continuar o Protocolo de Quioto? Basta a boa vontade de cada um: se todos cumprirem suas promessas, o clima sentirá a diferença!

Não tenho dúvidas de que 2010 será o ano dos céticos, dos "contras" - aqueles que querem derrubar as negociações globais. Só me espanta como eles estão sendo rápidos, criativos e flexíveis em suas estratégias!

2 comentários:

  1. "...esqueça o Mapa de Bali! Para quê gastar dinheiro com transferência de tecnologia? Adaptação? Para quê continuar o Protocolo de Quioto? Basta a boa vontade de cada um: se todos cumprirem suas promessas, o clima sentirá a diferença!"

    Mas, Silvia, eu acredito que se cada um fizer a sua parte, a coisa pode, sim, funcionar. Fiquei me perguntando pra que tanto fuzuê em Copenhague se bastaria cada um cuidar das próprias atitudes. Será que não funciona?

    E, olha, considerando o cenário atual, mais do que nunca acho muito importante estimular cada um a fazer a sua parte. OK, há os países pobres, que precisam sair da linha de miséria e precisam de ajuda para fazer isso de forma sustentável.

    Claaaaaro que seria muito melhor se o mundo resolvesse dar as mãos e trabalhar de verdade pra gente sair dessa. Mas, já que não fez, vamos tratar de arranjar nossos próprios jeitinhos. Não?

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  2. Nessa parte que vc copiou e colou do texto eu estava tentando ser irônica - essa é a tese que atualmnente os países desenvolvidos querem fazer prevalecer para tentar descartar os eixos de transf. financeira, tecnológica, adaptação etc. que estão previstos nos atuais trilhos das negociações.

    A questão do fazer sua parte é: e se não fizer, o que acontece? Quem diz que fez? Por isso as ONGs cobravam um acordo legalmente vinculante.

    Ah, e tem outra coisa: essas metas autodeclaradas não são suficientes para manter a temperatura abaixo dos 2 graus.

    Nos EUA, está havendo muita divulgação falaciosa, muita enganação em cima dessa história de clima. Temos que ficar espertos.

    bjs

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