Até quando?

Algumas notícias dos últimos dias:

1) Legislação no Brasil muda e agora acusados de estupro só serão processados se houver denúncia da vítima. Fico me perguntando como fica nos casos em que a vítima morre...

2) Sarkozy e várias outras personalidades se constrangem porque o “coitado” do Roman Polanski foi preso por um crime ocorrido há 30 anos. Na rádio Jovem Pan, aqui em São Paulo, a notícia inclusive foi dada dessa forma, fazendo menção apenas à época do crime. O fato de que tenha sido a prática de sexo com uma menor em alguns casos sequer é levada em conta.

Não tem jeito. Quando o assunto é sexo, o calendário não interessa: em 2009 a sociedade age segundo os mesmos parâmetros de 1009 e coloca a mulher em situação de inferioridade, submissão e culpa. Sim, culpa. Afinal, se o coitado do homem se excedeu em seus impulsos, certamente a vigarista facilitou. Seduziu. Tentou o infeliz como um capeta tenta sua vítima. E eis que jornalísticamente e juridicamente o réu torna-se vítima e vice-versa! Passamos por cima até de convenções mundiais, como as que foram assinadas sob a égide da Unicef, condenando a prática de sexo com menores. Esquecemos que se a menor está praticando sexo, bem, pode ser que não seja por opção mas justamente por falta de opção.

Vejo diariamente as notícias sobre a violência ao redor do mundo. A Faixa de Gaza, por exemplo, rende manchete dia sim, dia não. Mas o uso da violência sexual em conflitos eu só acho no site de notícias da ONU. Os dados sobre violência contra a mulher no Brasil só rendem notícia quando tem pesquisa nova, como ocorreu semana passada, quando saiu estudo mostrando como as adolescentes estão sendo acuadas (e espancadas) por seus namorados (igualmente adolescentes). E esta semana, em uma aula na Unicamp, uma das alunas apresentou uma pesquisa chocante sobre saúde da mulher: a morte no momento de parto ainda é uma das principais causas de óbito para o sexo feminino.

Isso para não falar na castração feminina: em nome de uma suposta tolerância da diversidade que ignora princípios básicos dos direitos humanos, permite-se que milhões de mulheres sejam literalmente mutiladas todos os anos em sua intimidade, eliminando qualquer possibilidade de prazer no sexo! Queria saber se em nome do respeito às “tradições religiosas” alguém permitiria sacrifícios humanos, uma prática que, não custa lembrar, foi corriqueira durante milhares e milhares de anos! Nem por isso é aceita!

Até quando a morte de uma mulher na hora do parto vai ser vista como algo que “faz parte da vida”?

Até quando a violência contra a mulher será tolerada?

Até quando o sexo forçado será visto como um direito do homem?

Até quando a sexualidade feminina será demonizada?

Até quando?

Um donut ou o planeta: o que você escolhe?

O Primeiro Ministro do Canadá escolheu um Donut.... e acabou recebendo um sabão dos ambientalistas que acompanham a reunião interseccional que está acontecendo em Bangkok, na Tailândia, e que serve de preparação para a CoP15, a tão esperada conferência que poderá sancionar um novo acordo do clima. Quem conta a notícia é Juliana Russar, do projeto Adote um Negociador, diretamente de lá!

O prêmio Fóssil do Dia é dado pelas organizações não governamentais que acompanham o evento, para a delegação que mais atrapalha as negociações ou para os autores das “pérolas” que nada agregam ao processo. O objetivo é justamente dar visibilidade, causando constrangimento no premiado e, desta forma, tentar inibir as ações que podem contribuir para a obstrução do processo de negociação. E por que o Primeiro Ministro do Canadá foi escolhido? Porque ele foi visto em uma loja de Donuts, ao invés de ir na ONU discursar sobre clima. O prêmio foi entregue na embaixada do Canadá em Berlim por ativistas alemães. Confira o vídeo da entrega:





Outro observador brasileiro, Gaines Morrow Campbell, do Vitae Civilis, relatou que “a equipe de negociadores do Brasil é de primeira linha e o histórico das suas contribuições ao processo é notável. O maior problema do Brasil é a falta de coerência entre suas políticas domésticas e suas posições nas negociações. Brasil tem dito que aceite compromissos de redução de gases de efeito estufa mas o seu plano e metas de redução de emissões de desmatamento e degradação de florestas não é realista, além do mais as suas emissões em outros setores continuam a crescer. O Brasil defende o uso de energias alternativas mas reduz os impostos sobre a fabricação de automóveis. Brasil defende e se beneficia de uma matriz energética limpa fundada nas hidroelétricas mas inclui no Programa de Aceleração do Crescimento – PAC a construção de usinas termoelétricas e nucleares. Brasil defende o Fundo Amazônia para combater o desmatamento mas não se importa que os recursos da Noruega para o fundo têm sua origem nas suas receitas de exploração de petróleo. Assim, para entender as posições do Brasil nas negociações é preciso saber ler entre e por trás das linhas. “

Segundo Gaines, “As negociações vão focar, entre outras, nas questões que os líderes mundiais subscreveram em Nova York na semana passada: ações de adaptação às mudanças de clima, redução de emissões de gases de efeito estufa provenientes do desmatamento e degradação de florestas – REDD, transferência de recursos financeiros e tecnologia e capacitação. Além disso, vai-se buscar clareza sobre: a redução de emissões pelos países desenvolvidos, o nível de ambição dessas reduções e seus impactos nas economias de países desenvolvidos e em desenvolvimento; o uso da terra e mudanças de uso da terra e florestas (sigla LULUCF em inglês); identificação de novos gases de efeito estufa a serem incluídos no acordo de Copenhagen e, ainda, a definição de anos base para controle das reduções de emissões.”

Começou mais uma rodada de negociações sobre clima

Não sei o quanto você está acompanhando essa história de negociações climáticas, mas fazendo um resumo breve:

1) elas são conduzidas pela ONU;

2) a ONU só delibera mediante consenso;

3) portanto todos os países membros têm que chegar a um consenso antes de se assinar um acordo;

4) por conta disso, estão sendo organizadas vááááárias reuniões preparatórias para a CoP15, que é quando supostamente o acordo climático que dará continuidade ao Protocolo de Kyoto será firmado.

Uma delas começou hoje em Bangkok, do outro lado do mundo. Que Buda nos ajude, como disse Juliana Aziz Miriani Russar! Essa brasileira integra o movimento Adopt a Negociator (Adote um Negociador), que reúne jovens de diversos países com uma única missão: seguir os negociadores que estão conduzindo as negociações de clima para checar o que eles estão fazendo (e contar para todo mundo!), dando transparência ao projeto. Confira o dia a dia deste novo encontro da ONU no site deles: http://adoptanegotiator.org/

Você também pode seguir a Ju pelo Twitter: @jubrcop15

Adaptação

Já falei neste blog sobre várias iniciativas bem intencionadas, porém mal sucedidas, na comunicação para a sustentabilidade. Invariavelmente da iniciativa privada. Não sei porquê, mas raramente eles conseguem acertar a mão: na maioria das vezes o que temos é puro greenwashing. Como no caso da propaganda sobre sacolinhas plásticas... Enquanto isso, as ONGs continuam dando de lavada em sua comunicação! O vídeo abaixo é mais um exemplo: criado pela Y&R, ele se baseia no conceito da evolução das espécies, tal como Charles Darwin concebeu, ao mostrar a evolução de um personagem pré-histórico estilizado, em uma animação que aproveita a estrutura dos videogames para expor como não é o planeta quem se adapta a nós, mas o contrário. É maneira criativa e didática de colocar a questão das mudanças climáticas ao alcance do entendimento de qualquer um. Ele faz parte da campanha TicTac, que visa mobilizar a sociedade para pressionar os negociadores que fecharão o novo acordo sobre mudanças climáticas agora, em dezembro. E quebrando o paradigma de que os materiais das ONGs só estão disponíveis na internet ou em circuitos alternativos, este filmete está em exibição nas salas das redes Cinemark, UCI e Rain. Show!

Hora de Acordar Global acordou geral!

A Hora de Acordar Global, realizada nesta última segunda-feira, 21 de setembro, acordou geral a galera em todo o mundo! Foram 2632 eventos em 135 países. Milhares de pessoas foram às ruas, fizeram barulho, ligaram para os seus governantes... da Austrália à Europa, passando pelas Américas, pelo Brasil! Confira no vídeo abaixo:



Mas um dia só de manifestação não foi suficiente. Por isso, prepare-se: a próxima mobilização acontece em 24 de outubro. Acesse o site da campanha - www.tictactictac.org.br - cadastre-se e mantenha-se informado! Falta muito pouco tempo até a Conferência Mundial de Mudanças Climáticas da ONU em dezembro, em Copenhagen. Temos que fazer nossa opinião chegar até os negociadores, já que eles insistem em ouvir apenas os lobbies organizados dos setores que querem manter tudo como está!

Você investiria em um fundo vindulado a índice de crédito de carbono?

A novidade do Itaú Unibanco, apresentada em coletiva de imprensa hoje: um fundo de investimentos vinculado a um índice de créditos de carbono. Trata-se da primeira iniciativa dessas natureza no Brasil. Ok. Mas você investiria nele?

Para responder a esta pergunta, é importante que você entenda o que é o mercado de carbono. Confesso que eu pouco sabia sobre o tema e por isso agradeci porque o pessoal do Itaú Unibanco chamou o presidente da Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Carbono – Abemc, Flavio Gazani, para dar uma aula. Ele lembrou que tudo começou com o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU, pelo qual chegou-se a um consenso sobre o impacto das emissões dos gases de efeito estufa sobre as mudanças climáticas. Foi por conta dessa constatação que as nações desenvolvidas (com exceção dos Estados Unidos) assinaram o Protocolo de Kyoto, comprometendo-se com metas de redução na emissão desses gases, entre os quais está o gás carbônico (CO2).

Essa redução pode ser feita de várias formas: com mudanças tecnológicas, com uma matriz energética mais limpa e também mediante mecanismos de troca - quem não consegue reduzir as emissões estimula quem consegue e contabiliza a redução do outro nas suas metas. Esse é o chamado Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Os projetos têm que passar por aprovação nacional, da ONU e por auditorias para comprovar que há efetivamente a redução alegada. Essa é a teoria. Na prática, normalmente os países que não têm metas a cumprir no Protocolo de Kyoto (como nós, aqui no Brasil, ou a China) desenvolvem os projetos e depois oferecem os créditos em carbono. Por convenção, uma tonelada de carbono que deixa de ser emitida equivale a um crédito.

Existem bolsas especializadas na comercialização deles, como se fossem bolsas de valores. A maior delas fica em Londres. Não é por acaso: o Reino Unido é o maior comprador mundial, com 39% das transações, seguido pelas nações do Mar Báltico, com 17%, e Itália, com 9%. Do lado dos vendedores, a China é líder inconteste, com 84% dos projetos, seguida por Ìndia, com 4%, e Brasil, com 3%. A diferença brutal justifica-se: a matriz energética lá é muito suja, portanto o país tem um enorme potencial de redução em suas emissões. No caso do Brasil, nossa matriz é limpa. Ainda assim, do total de projetos de MDL desenvolvidos no Brasil, 50% são de energia renovável, por conta da co-geração em usinas de açúcar e álcool – o que explica porque São Paulo tem 23% dos projetos brasileiros de MDL. Em seguida vem Suinocultura (13%), troca de combustível fóssil (11%) e aterros sanitários (9%).

O mercado regulado pelo Protocolo de Kyoto chama-se... mercado regulado (um caso raro em que não foi criada uma sigla esdrúxula). Mas além dele, existe outro, desenvolvido pelos países que não assinaram o protocolo. Ele se chama mercado voluntário, porque não está relacionado com metas. Ele é pequeno em relação ao mercado total de créditos de carbono (apenas 2,9%), porém cresce vertiginosamente: apenas em 2008 sua expansão foi de 87%.

O volume de negócios com créditos de carbono em 2008 foi de US$ 705 milhões. O faturamento, por sua vez, foi de US$ 126 bilhões nesse mesmo período. Ou seja, é um negócio lucrativo, portanto atraente para o empresário – e, por isso, tende a crescer, apesar de todas as incertezas que existem quanto à sua natureza jurídica, governança na questão climática no Brasil e eventuais mudanças que venham a ser estabelecidas agora no final do ano na CoP15.

Já existem hoje em todo o mundo US$ 12,5 bilhões em fundos atrelados a créditos de carbono. Hoje, o Itau Unibanco lançou o primeiro a operar no Brasil. Ele promete ser uma aplicação tão o mais rentável que outras. E, indiretamente, estimula a migração para uma economia de baixo carbono. Por que não apostar?

Bill Clinton: investir na mulher é o melhor caminho para combater a pobreza

Aconteceu durante o quinto encontro anual da Clinton Global Initiative, promovido pela ONG dirigida pelo ex-presidente norte-americano que ficou famoso por suas investidas sexuais fora do casamento. Não sei se para se redimir ou por realmente só pensar em mulher, mas a verdade é que a seção de abertura do evento foi dedicada às mulheres. Para ser mais específica, para mostrar como o investimento na mulher é o caminho mais eficiente para se erradicar a pobreza.

Segundo relatos que peguei na internet, a realização ficou aquém da intenção. Mas com certeza já valeu para colocar o assunto na pauta do dia. Porque em pleno século XXI, a discriminação da mulher ainda é real. Para você ter idéia da situação, Clinton disse que atualmente as mulheres são responsáveis por 66% de todo o trabalho do mundo, produzem 50% dos alimentos do planeta, porém só respondem por 10% da renda mundial e por 1% das propriedades no planeta. Mais da metade (57%) da população contaminada pelo vírus HIV na África subsaariana é de mulheres; entre os jovens, esse índice sobe para 75%. Não sei se você sabe, mas naquela região acredita-se que transar com uma virgem “limpa” o homem da doença, crença que está na raiz dos vergonhosos números de estupros e contaminação na região. Outros palestrantes complementaram: apenas 1% das verbas destinadas aos países em desenvolvimento é direcionada para programas que beneficiam mulheres.

E não pense que isso é coisa que só acontece na África! Aqui no Brasil, as estatísticas indicam que a cada 15 minutos uma mulher é espancada. Os dados sobre desigualdade de salários estão no site do IBGE. E basta uma viagem para o interior do país para perceber que ainda somos uma nação muito, muito machista.

Diante desses números, os palestrantes do evento (entre eles, Edna Adan, diretora de um hospital na Somália e que foi a primeira mulher a dirigir um carro naquele país) explicaram que a educação é o fator mais importante para o empoderamento da mulher. Não só por favorecer a entrada no mercado de trabalho, mas principalmente porque leva a mulher a querer (e a ter) controle sobre sua fertilidade. A partir do momento em que começa a ter menos filhos, ela interrompe o processo de multiplicação da pobreza – e uma das principais causas de mortalidade entre mulheres no mundo subdesenvolvido. Também ganha condições de lutar por trabalhos mais dignos e melhor remunerados, beneficiando sua comunidade: pesquisas mostram que as mulheres reinvestem 90% de seus ganhos no bem estar de sua família, contra 35% dos homens. Melhor acesso à educação está por trás de uma queda de 43% nos índices de má nutrição registrados entre 1970 e 1995.

E um dado curioso: os telefones celulares contribuem nesse processo, pois o hábito de usar mensagens de texto eleva o nível de alfabetização.

Surge o conceito de Serviço Ambiental Urbano (e seu respectivo pagamento)

Somente 3% do lixo doméstico é reciclado. Quando se contabiliza o lixo industrial, esse percentual sobe para 11% - pouco mais da metade da meta do Plano Nacional sobre Mudança do Clima, que prevê 20% de resíduo reciclado em 2015. Estes dados foram apresentados pelo Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, que anunciou hoje o pagamento para os catadores pelo serviço prestado ao reciclar lixo, assim como acontece com o pagamento por serviços ambientais realizado na floresta com o plantio de árvores.

O raciocínio faz sentido. Dentre os ganhos ambientais gerados pela coleta correta do lixo está a redução da quantidade de resíduos no ambiente, impedindo a poluição da água e do solo. Esse material é direcionado para locais em que podem ser reciclados e voltar a ser utilizados. Ao reinserir esse produto no mercado, economiza-se a energia que seria usada para a produção de novos materiais. Isso está diretamente relacionado a outro ganho ambiental, que é a redução de emissão de gases de efeito estufa.

O Pagamento por Serviços Ambientais Urbanos (PSAU) é uma iniciativa inédita no mundo que contará com aglumas salvaguardas para assegurar sua efetividade. Uma delas é a parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que irá estudar quanto deverá ser pago por quantidade de material reciclado para garantir um preço justo pelo serviço prestado pelo catador. Outra é a garantia de preço mínimo para os produtos, de forma a evitar oscilações, como as que ocorreram em consequência da crise econômica e que afetaram diretamente os catadores em todo o Brasil.

O Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis estima que cerca de 1 milhão de catadores em todo o Brasil poderão ser beneficiados pela medida.

Manifesto Dia Mundial Sem Carro

São Paulo precisa e pode ter um trânsito melhor, um transporte público eficiente e de ótima qualidade, muito mais ciclovias e ciclofaixas, um ar mais limpo e respirável e melhor qualidade de vida para todos que aqui vivem e trabalham!!!

O trânsito de São Paulo ocupa um tempo precioso de todos os que vivem, estudam e trabalham na cidade. Tempo precioso de nossas vidas, tempo que deixamos de fazer inúmeras outras atividades ligadas à cultura, ao lazer, aos estudos, à família e aos amigos, além do tempo que perdemos de sono e descanso.

Não bastasse todo este tempo perdido, ainda ficamos expostos a um trânsito totalmente poluído, respirando gases nocivos que causam inúmeras doenças respiratórias e cardiovasculares, além de tumores e abortamentos, entre outras. Estudos da Faculdade de Medicina da USP apontam que morrem na cidade, em média, 12 pessoas por dia devido à poluição, encurtando a vida media dos paulistanos entre um ano e um ano e meio. Além do custo em vidas, os impactos operacionais e financeiros no sistema de saúde, causados pela poluição, são imensos.

No mesmo sentido, é importante lembrar que o setor de transportes é responsável por 15% dos gases que causam o aquecimento global e a mudança climática. O diesel e a gasolina consumidos no Brasil estão entre os piores do mundo e a indústria automobilística fabrica motores menos poluentes em vários outros países e no Brasil apenas para exportação. A inspeção veicular, obrigação dos governos estaduais e dos grandes municípios, ainda está muito longe de cumprir seu papel.

No caso dos acidentes de trânsito, morrem cerca de 4 pessoas por dia na cidade – 44% pedestres, 18% motociclistas, 9% passageiros ou motoristas de autos e 3% ciclistas. Parece mentira, mas a grande vítima dos acidentes de trânsito são aqueles que estão se locomovendo a pé, o que demonstra a lógica perversa das cidades que priorizam seus espaços e fluxos para os automóveis. Estudo da Fundação Getúlio Vargas calcula que a cidade deixa de gerar R$ 26,8 bilhões por ano devido à perda de tempo nos congestionamentos e aos custos totais ligados aos acidentes e doenças derivadas do trânsito.

Muitos fatores alimentam todos estes números sinistros, mas vale lembrar os principais. Nosso modelo de desenvolvimento urbano promove uma enorme desigualdade social que obriga milhões de pessoas a se locomover por grandes distâncias para ter acesso ao trabalho e aos serviços e equipamentos públicos. Vivemos, cada vez mais, um modelo de mobilidade e transporte que oferece todos os incentivos possíveis para a locomoção por meio do automóvel. Enquanto isso os investimentos em transporte público coletivo continuam se arrastando lentamente, ocorrendo, em 2009, redução da frota de ônibus em circulação na cidade – segundo o Detran-SP, a frota de ônibus caiu de 41.876 (jan/09) para 41.628 (jun/09). Bilhões de reais que poderiam melhorar imediatamente o transporte público serão gastos em túneis, novas pistas e avenidas - e ampliação de antigas - que em pouco tempo estarão entupidas (800 novos carros entram por dia nas ruas de São Paulo!).

Precisamos romper esta lógica perversa: enquanto o Governo Federal promove incentivos fiscais e creditícios para a indústria automobilística, inclusive sem nenhuma contrapartida em termos de motores menos poluentes e uma matriz energética mais limpa, os governos estaduais e municipais vão rasgando túneis e avenidas com recursos públicos! Se não reagirmos, todos estaremos cada vez mais estressados, doentes, presos em novos congestionamentos e muito distantes de termos um transporte público coletivo decente, saudável e eficiente, como todas as principais cidades do mundo já o possuem há muito tempo.

Diante dessa realidade que pode ser mudada, propomos:

- Aceleração e prioridade absoluta para o metrô, trens e os corredores de ônibus;
- Ampliação substantiva da frota de ônibus da cidade com serviço de alta qualidade;
- Reativação e fortalecimento do Sistema Trólebus;
- Priorização de ações da CET para aumentar o fluxo do transporte coletivo;
- Definição de ações e metas para reduzir significativamente os congestionamentos;
- Cumprimento da lei que prevê ciclovias em novas avenidas e construção de todas as ciclovias e ciclofaixas já projetadas;
- Cumprimento da Resolução 315 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) para melhorar a qualidade do diesel;
- Início imediato da substituição do diesel e gasolina por combustíveis mais limpos;
- Comercialização no Brasil de automóveis, ônibus e caminhões com a mesma tecnologia menos poluente que a indústria automobilística utiliza nos países europeus e nos Estados Unidos;
- Segurança para o pedestre, calçadas de boa qualidade, acessibilidade universal para os deficientes físicos, rigor nas leis de trânsito e educação cidadã para termos uma cidade que garanta uma mobilidade digna, inclusiva e segura;
- Inspeção veicular em toda a frota automobilística;
- Redimensionamento dos investimentos públicos para diminuir a desigualdade social e regional na oferta de trabalho e no acesso a equipamentos e serviços públicos;
- Construção de um Plano Municipal de Mobilidade e Transporte Sustentáveis, com ampla participação da sociedade para decidir pelos investimentos públicos na área;
- Basta de desperdício de dinheiro público em projetos atrasados, ineficientes e insustentáveis!
Coletivo de Mobilização do Dia Mundial Sem Carro

Global Wake Up Call - Hora de Acordar Global acontece nesta segunda, 21 de setembro, em todo o mundo

Em dezembro, a ONU reunirá decisores de todos os países associados para deliberar sobre como será a continuidade do Protocolo de Quioto. Dada a complexidade do tema, várias reuniões preparatórias têm sido realizadas. Nelas, está ficando evidente a má vontade de todos os países em colaborar. O que é um contrassenso, já que tais pessoas foram nomeadas para nos representar e nos defender. Mas eles só representam o interesse de pequenos grupos de interesse - por exemplo, os produtores de petróleo (no nosso caso, a poderosa Petrobrás), os fabricantes de veículos... Os lobbies econômicos estão se sobrepondo ao princípio de precaução que é preciso adotar em relação às mudanças climáticas. Já existem estudos suficientes que mostram que a postura preventiva deve ser adotada. Mas a menos de 100 dias do evento que deve decidir o quanto seremos preventivos, tudo indica que também na ONU as coisas podem acabar em pizza.

Por isso várias ONGs de todo o mundo estão chamando para um dia mundial de manifestações, que acontece amanhã, segunda, 21 de setembro. A Hora de Acordar Global, tradução literal do nome original (Global Wake Up Call) já tem mais de 200 eventos agendados no Brasil. Para saber se vai rolar um perto de você, entre no site da campanha: http://www.tictactictac.org.br/ Em São Paulo, por exemplo, haverá uma manifestação no vão do MASP, na Avenida Paulista, entre 12h00 e 14h00.

É importante participar para mostrar que a sociedade civil (= eleitores, = consumidores) está antenada. As imagens entrarão nos noticiários e poderão sensibilizar os líderes que se reunirão no dia seguinte, 22 de setembro, na Assembléia Geral da ONU para dizer o que esperam decidir em Copenhague, em dezembro. O Presidente Lula será o primeiro chefe de Estado e Governo a falar na assembléia da ONU no dia 22 e falará em seu nome - faça com que ele saiba o que você quer dizer: participe da Hora de Acordar Global!

Dia de faxina

Este final de semana tem faxina! Em todo o mundo voluntários e organizações não governamentais estão organizando grupos para limpar praias. Para participar do Clean Up the World (Limpe o Mundo), basta reunir um grupo e se inscrever no site da campanha Aqui no Brasil, diversas ONGs já aderiram ao movimento. Entre elas, a Fundação SOS Mata Atlântica, que reunirá voluntários neste domingo, 19 de setembro, na Praia Branca e na Praia Preta no Guarujá (SP).

Esta campanha tem sido realizada desde 1988, sempre no mês de setembro, e é considerada o maior esforço de limpeza do ambiente marinho em todo o mundo. Nesse dia é removido lixo das regiões costeiras, praias e canais dos oceanos, rios e lagos do mundo; ocorre a coleta de dados sobre a quantidade e qualidadedeste lixo; pessoas são educadas em relação ao descarte de lixo no ambiente marinho, entre outras ações socio-educativas. A cada ano cresce mais o número de voluntários e países envolvidos nessa causa. Para esta edição, a expectativa dos organizadores é que 35 milhões de participantes de mais de 120 países façam a diferença para o ambiente.

Gostou da idéia? Se não puder participar, divulgue. E, se puder, participe!

10 mitos sobre sustentabilidade

1 – As pessoas não sabem o que é sustentabilidade
Ok, o conceito de sustentabilidade está em construção, porém sabemos o que não é sustentável. Já é um começo, né, greenwashers?

2 – Sustentabilidade é assunto da esfera empresarial
Sustentabilidade é um novo jeito de ver o mundo por pessoas, governos e empresas. Cada um tem seu papel e sua importância na tarefa de construir um mundo mais justo, humano e com melhores perspectivas para nossos descendentes.

3 – Sustentabilidade = meio ambiente
Nãããããoooo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! Sustentabilidade engloba questões ambientais, mas não se restringe a elas. Na verdade, o fator humano é o preponderante porque o planeta vai sobreviver, mesmo se nos matarmos numa guerra nuclear ou se conseguirmos elevar a temperatura em 100⁰C!!!! Somos nós, humanos, que estamos em risco – e colocando em risco inúmeras outras formas de vida. Para sairmos do risco, precisamos cuidar do meio ambiente, mas também assegurar condições dignas de vida a todos nossos semelhantes.

4 – Sustentabilidade = responsabilidade social
Nãããããoooo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! É também responsabilidade ambiental, financeira, cultural...

5 – Sustentabilidade se resolve criando um departamento (uma editoria, um decreto) para cuidar disso
Sustentabilidade é um jeito de ver o mundo. Uma maneira de viver. Um sistema de gestão empresarial. Pode ser uma plataforma política. Uma nova cultura global. Em qualquer das hipóteses, é algo transversal que envolve vários atores.

6 – Dá para manter os atuais níveis de consumo sendo sustentável
Hahahaha! Ninguém quer tocar neste ponto mas, não, não vai dar para ter 2 bilhões de pessoas consumindo tresloucadamente e mais de 4 bilhões abaixo da linha da pobreza. O consumo terá que ser mais equilibrado, mais responsável, mais justo e também mais acessível a todos.

7 – Sustentabilidade é luxo de quem é rico
E não deveria ser! Mas tem muita gente que trabalha sustentabilidade segundo regras estabelecidas do marketing, segundo as quais uma novidade é posicionada a um preço mais alto. Se a novidade é vista como algo voltado a um nicho (no caso, o grupo de pessoas preocupado com o tema), o preço mais alto prevalece mesmo depois do lançamento. Nesta visão, o tema é tratado como diferencial de produto, sustentáculo de marca – e não como uma nova cultura, uma nova visão de mundo.

8 – Sustentabilidade é uma moda e, portanto, vai passar
Várias das formas como a sustentabilidade vem sendo tratada devem passar. A tendência em si, no entanto, vai ficar – mas será diferente, daqui a alguns anos, do que é hoje. Afinal, estamos construindo conhecimento a respeito.

9 – Não há evidências científicas que justifiquem essa grita pela sustentabilidade
????

10 – Sustentabilidade não tem a ver comigo
Ah,tá... você é de outro planeta?? Espero que seja quente por lá, porque aqui na Terra a chapa está esquentando....

Shana tová!

Hoje não vou falar de mudanças climáticas, direitos humanos ou greenwashing. Hoje não quero falar de problemas. Hoje eu quero agradecer pelo último ano da minha vida. Ou melhor, pelo primeiro ano do resto da minha vida.

Há 10 anos, eu olhei para a frente e disse para mim mesma: antes dos 45, vou mudar minha vida (xi, entreguei a idade...). Foi quando começou minha busca por algo que desse sentido à minha vida. Sim, eu tenho essas frescuras de ter que ter um sentido para a vida! Não, ganhar dinheiro não é suficiente. Bom, eu olhei para fora, para dentro, para os lados... mas as peças custavam a se encaixar dentro de um plano lógico e seguro. Afinal de contas, eu achava que tinha muito a perder se fizesse a jogada errada!

O que eu não percebi é que a partir do momento em que decidi mudar, eu já havia traçado meu caminho. A mudança interna foi colocada em curso. E quanto mais eu demorava a fazer as mudanças externas, maior a pressão (e a insatisfação, e o mau humor, e a TPM... rs!). A pressão crescia porque um novo ser se formava do lado de dentro, mas a pele continuava a mesma. Eu sei que a imagem é batida, mas eu realmente me senti como a lagarta dentro da crisálida, se transformando... até o momento em que a crisálida deixa de ser proteção e passa a ser limitação. Passa a incomodar. E exige rompimento. Renascimento.

O rompimento aconteceu no Rosh Hashanah do ano passado. No exato instante em que o sol se punha no horizonte, o piloto anunciou que estávamos entrando no espaço aéreo de Israel. Acredite: foi uma emoção muito grande! Se eu tinha alguma dúvida de que aquela viagem representava o início de um novo ano na minha vida, o destino se encarregou de esclarecer. E de repente, tudo começou a fazer sentido e naturalmente eu comecei a mudar tudo na minha vida: hábitos, estudos, trabalho, projetos de vida... Consegui diminuir sensivelmente a quantidade de chocolate que como! Sou praticamente uma ex-chocólatra! risos!

Ok, aconteceram uns contratempos aqui e ali. Teve um relacionamento lindo que tomou um rumo inesperado. Mas que sobreviveu à mudança, provando que valeu cada segundo de emoção que investi nele - provando, principalmente, que é amor e que amor pode ser compartilhado de diversas formas. Teve também um ciclo profissional de 20 anos que se encerrou de forma muito tosca! Mas olhando para trás, vejo que foi o jeito como a vida me ensinou o desapego.

Enfim, foi um ano em que a mão de(a) Deus(a) se fez presente na minha vida. E cuja presença eu quero agradecer. Foi um ano em que eu VIVI, depois de tanto tempo apenas sobrevivendo, anestesiada das emoções. Sim, fui mais feliz. Mas também senti mais a tristeza, a solidão... Optar pela vida é optar pelo sentimento: traz mais alegria, mas também nos deixa mais sensíveis ao sofrimento. Nos deixa mais humanos (portanto menos autômatos, menos máquinas).

Obrigada a você que passa aqui no meu blog e acompanha meus textos. Obrigada a todos que me ajudaram neste ano. Shana tová: o ano novo começa no por do sol desta sexta. E eu quero começar a comemorá-lo desde já!

Mudanças climáticas: nem tudo que é lógico faz sentido

Estudo da London School of Economics concluiu que o controle de natalidade é a forma mais barata de reduzir as emissões de carbono no futuro. Lógico! Assumindo que as emissões são provenientes da atividade humana, a forma mais eficiente de resolver o problema é ir direto à fonte, ou seja, nós. Pois quanto menor o número de humanos em atividade, menor o volume de emissões de CO2. Lógico!

Também é lógico considerar, como pano de fundo, os atuais dados sobre população e emissão de CO2 no planeta: já somos 6,7 bilhões de pessoas no planeta; a cada hora, são dez mil novos emissores de carbono, 1,5 milhão a cada dia e 80 milhões a cada ano, afirmam os autores do estudo. Mais lógico ainda é fazer as contas para checar se a sugestão é viável e, principalmente, mais barata que outras sugestões que andam circulando por aí. Foi o que os autores fizeram: considerando-se a oferta de métodos contraceptivos para as 200 milhões de mulheres que, segundo a ONU, engravidam sem querer por ano, evitaríamos a emissão de 34 milhares de milhões de toneladas de emissões de dióxido de carbono até 2050 – o que dá um custo de sete dólares por tonelada. A título de comparação, estudo da consultoria McKinsey sobre o custo da transição para uma economia baseada em fontes de energia de baixas emissões resulta em uma cifra de 32 dólares por tonelada, em 2020.

Depois de tudo isso, não é lógico que a ONU inclua o controle da natalidade na agenda da Conferência Internacional de Mudanças Climáticas agora, no final do ano, quando vai ser decidida a continuação do Protocolo de Quito? Lógico! E é essa a proposta da organização não governamental Optimum Population Trust, que encomendou o estudo à London School of Economics.

Só tem duas coisas nessa história toda que não são muito lógicas:

1 - Pleitear o controle da natalidade pela questão climática e não pela direito da mulher de decidir se quer ou não ter filhos. Assim como as tradições impõem a questão da reprodução acima da decisão individual da mulher, o raciocínio exposto acima igualmente impõe uma obrigação sobre a mulher, alijando-a do seu direito de decidir se quer ou não ter filhos. Eu sou totalmente a favor do controle da natalidade, porém como direito da mulher, não como uma obrigatoriedade climática! Ainda mais quando essa obrigatoriedade é falaciosa visto que:

2 - A teoria apresentada ignora o fato de que apenas 2 bilhões dos 6,7 bilhões de pessoas que habitam o planeta estão acima da linha da pobreza. E que é justamente essa a faixa de pessoas que mais e me utiliza métodos contraceptivos. Portanto, relacionar a questão climática apenas ao aumento da população sem levar em conta o poder aquisitivo e o estilo de vida das populações é transferir o ônus da questão para a maioria pobre – e que, por não consumir sequer o básico, impede um aumento das emissões muito maior do que o registrado até o momento.

Como já tive a oportunidade de escrever neste blog, o que mais me assusta atualmente é que sustentabilidade e mudanças climáticas estão virando papel de embrulho para empacotar qualquer coisa. Hoje, para chamar a atenção para um tema, basta relacioná-la com mudanças climáticas. Além de ser desonesta, essa atitude levará inevitavelmente ao efeito ressaca, quando ninguém vai querer ouvir falar de clima! E aí o que é realmente sério e urgente vai sofrer para obter a atenção necessária...

Europa incluirá dados ambientais no cálculo do PIB a partir de 2010

A partir do ano que vem a União Européia utilizará indicadores ambientais para complementar o cálculo de seu Produto Interno Bruto. Serão incluídos dados sobre o nível de poluição e de impactos ambientais dentro do bloco europeu, questões como biodiversidade, mudanças climáticas, uso de água e geração de resíduos. Há, ainda, a intenção de divulgar tais dados com mais agilidade, já que atualmente eles levam de dois a três anos para serem atualizados.

Pode ser uma boa: há tempos que a forma atual como o PIB é calculado tem sido criticada. As falhas são evidentes: o trabalho doméstico produzido por uma dona de casa, por exemplo, não é computado. Já as obras de restauro dos danos provocados por um acidente ambiental, por exemplo, puxam o PIB para cima. Tais distorções têm estado na berlinda e modelos que se propõem a contemplar outros indicadores, como o bem estar social, estão sempre sendo apresentados. Esse é o caso do IDH-Índice de Desenvolvimento Humano, criado pela ONU. Ou do FIB-Felicidade Interna Bruta, que está em uso no Butão e em algumas comunidades pelo mundo (inclusive no Brasil), mas ainda é visto como algo exótico, como um experimento.

Não é para menos: ao incluir novos dados, os pesquisadores podem chegar a resultados questionáveis – como, por exemplo, eleger a Costa Rica como o país com habitantes mais satisfeitos. A proeza é da organização londrina New Economic Foundation, que criou o Índice do Planeta Feliz (HPI - Happy Planet Index). Com base em três indicadores - pegada ecológica, satisfação de vida e expectativa de vida – a ONG concluiu que os costarriquenhos deveriam liderar o ranking mundial por ter uma expectativa de vida longa e 99% da sua necessidade energética suprida com fontes renováveis. Você concorda? Pois é... Esse assunto não acaba tão cedo...


Mas se a União Européia incluir indicadores ambientais, a iniciativa poderá gerar um efeito cascata, dado o peso da região na economia mundial, a quantidade de multinacionais com operações em outros países e o peso que o tema pode vir a assumir em negociações internacionais. Não sejamos ingênuos: tem muita gente usando o verde e a sustentabilidade visando criar reserva de mercado e barreiras mercantis. Mas não há como negar seu efeito “didático”, já que leva as pessoas a enxergar a economia de uma nova maneira.

O que você achou da campanha em prol das sacolinhas plásticas?

Como milhóes de brasileiros, eu estava assitindo o último capítulo de Caminho das Índias quando vi o comercial da Abiplast sobre as sacolinhas plásticas. Trata-se do início de uma campanha orçada em R$ 7 milhões, custeada por fabricantes de sacolas plásticas e empresas petroquímicas, como Braskem, Quattor e a Petrobras. Ela conta com o apoio de um site e tem o suposto intuito de "tentar esclarecer a população a respeito do uso consciente das sacolas e do real impacto do produto ao meio ambiente", como escreveu o jornal O Estado de S. Paulo nesta última quarta, dia 9 - numa flagrante evidência de como o jornalismo brasileiro está distante da postura crítica que desejada (e alardeada em suas campanhas publicitárias). Caso você não tenha visto, clique abaixo e assita o filmete:



Bom, vamos começar pelo básico: a finalidade básica da sacola é transportar mercadorias. Ponto. Os demais usos, mostrados no filme, foram criados pelo consumidor justamente porque há sacolas plásticas em demasia em nossas casas. Se não houvesse, as soluções seriam outras - e poderiam ser mais sustentáveis. Por exemplo, o saco de lixo do banheiro pode ser de papel.

Chocou-me sobremaneira aquela cena das crianças jogando futebol com uma bola feita de sacolas plásticas. Uma bola feita de sacolas plásticas é uma evidência da pobreza, não é uma forma bacana, alegre, legal de usar o plástico, como vcs tentam mostrar! Sinceramente, eu fiquei passada com a tentativa de inverter a simbologia daquela imagem!

Outro problema sério da campanha é que ela destaca que há que se dar um descarte correto, porém deixa essa questão sem resposta, pois sabemos que a reciclagem de sacolas plásticas praticamente não existe na prática. Isso tampouco é resolvido com eficiência no site da campanha: embora ele tenha uma ferramenta "muderrna", baseada em google maps, ele simplesmente não dá resposta sobre os recicladores perto do endereço que você digita! Para falar a verdade, no site do Instituto Sócio Ambiental dos Plásticos (!!!!) é possível muito mais informações - e de muito melhor qualidade!

O plástico gera emprego, renda e produtos muito úteis para nosso dia-a-dia, porém eles não se degradam e, por isso, causam um problema ambiental seríssimo. Não faz sentido colocar no ambiente um produto que vai demorar séculos para se degradar e cujo uso foi de alguns minutos, para transportar um produto do guichê de pagamento ao carro e do carro para dentro de casa! Sua reutilização, portanto, deve ser estimulada, sim, porém seu consumo deve ser reduzido para que possamos aproveitar o que já existe - e não colocar mais lixo no ambiente. A cadeia de reciclagem e reaproveitamento tem que ser mais competitiva e, para tanto, é preciso que o uso do usado seja estimulado, não o do novo para gerar um usado.

Ao invés de gastar R$ 7 milhões para fazer greenwashing, as empresas fabricantes de sacolas plásticas e de matérias primas para tais sacolas deveriam destinar esses recursos para a pesquisa de materiais e tecnologias menos danosas ao ambiente, reciclando seus negócios. É como geradores de tecnologia e de produtos que as empresas podem contribuir para a sustentabilidade de nossa sociedade, e não com supostas ações de "esclarecimento" que nada mais são do que defesa de interesses setoriais.

E você, o que achou desta campanha?

Campanha TicTac recruta voluntários para a Hora de Acordar, em 21 de setembro

No dia 21 de setembro vai acontecer a “Hora de Acordar”, evento que integra a campanha Tic Tac de sensibilização sobre a necessidade de tratar com prioridade e urgência as questões relacionadas com mudanças climáticas na Conferência do Clima que a ONU organizará no final do ano em Copenhagen, onde será definida a nova fase do Protocolo de Quioto. A idéia é realizar milhares de eventos simultaneamente no mundo todo no dia 21: seminários, plantio de árvores, mobilizações, teatro de rua, ou seja, tudo que contribuir para a disseminação da causa climática e ambiental! Todos serão organizados por voluntários - e é por isso que os organizadores da campanha estão neste momento pedindo a ajuda de todos os interessados.

Como fazer?

1 - Converse com amigos, vizinhos, familiares, membros de sua igreja, clube ou escola e junte uma turma.

2 - Escolha um local para a manifestação e cadastre-o em http://www.avaaz.org/po/sept21_hosts para que outras pessoas possam saber do seu evento e participar dele também. Nesse mesmo link você poderá ver os eventos já cadastrados e, se preferir, organizar uma turma para participar de uma ação organizada por outro grupo.

3 - Entre no site da campanha Tic Tac e baixe os materiais já existentes - eles podem lhe ajudar na organização e divulgação do evento. Em breve os organizadores colocarão lá mais orientações e materiais para facilitar a organização do evento. E lembre-se: o evento deve levar a mesma mensagem, ou seja, é Hora de Acordar nossos governantes!

4 - No dia 21, você e os demais participantes do seu evento devem fazer muito barulho, coletar assinaturas em um abaixo assinado, tirar fotos e filmar a atividade. As fotos e vídeos destes eventos do mundo todo serão coletados e editados para serem entregues aos chefes de estado e a mídia presentes na Assembléia Geral da ONU onde as mudanças climáticas serão discutidas.

A Campanha Tic Tac Tic Tac é uma corrida contra o tempo - daí o nome escolhido, Tic Tac, que faz alusão ao barulho que os relógios de antigamente faziam. Ela é fruto do esforço coletivo de dezenas de grupos e organizações do mundo todo. Para saber mais, visite http://www.tictactictac.org.br/ Caso tenha perguntas, dúvidas ou sugestões, escreva para: contato@tictactictac.org.br.

E veja abaixo um vídeo sobre o lançamento da campanha em São Paulo. Ele foi produzido por Tomaz Cavalieri, da 10e 20 filmes (http://www.10e20.com.br/) com a colaboração da equipe de voluntários e integrantes do Vitae Civilis e apoio da TV PUC.

Para os fãs de Harry Potter

Quem me conhece sabe que eu AMO o Harry Potter! Pois bem: eis que descobri que gente que também ama o mundo criado pela JKRowling resolveu unir forças para fazer mágica - tentar transformar o nosso mundo! Criaram a ONG The Harry Potter Alliance, que une fãs para trocar idéias sobre a obra, subir vídeos e textos próprios etc. e para acompanhar e discutir temas como a situação em Darfur, Burma, discutir questões referentes a meio ambiente, homossexualidade, pobreza... E o universo potteriano se une à ação social, como no vídeo abaixo, pelo qual a ONG denuncia o impacto dos grandes supermercados sobre o pequeno comércio local, elevando seu apelo junto aos jovens familiarizados com os personagens. Muito legal!

Já que está todo mundo assistindo a novela...

... que tal conferir a interconexão entre tudo e todos depois de conferir os desencontros entre a Maya e o Raj?

Dúvidas



  1. Se o core business de uma empresa é condenado socialmente (ex.: fumo, armas), ela pode ser classificada como sustentável se adotar boas práticas ambientais, sociais, econômicas etc.?

  2. Critérios de sustentabilidade que não são acessíveis a toda a cadeia econômica podem ser chamados de sustentáveis?
  3. Um relatório que usa linguagem excludente pode ainda assim ser um relatório de sustentabilidade?

  4. Ver a sustentabilidade como "um pilar da marca" é sustentável?

  5. Fazer o funcionário "vestir a camisa" da empresa é sustentável?

  6. Obrigar o fornecedor a comprar o produto da empresa para se tornar / se manter como fornecedor é sustentável?

  7. Exigir o menor preço como condição sine qua non - sejamos nós, consumidores, ou os departamentos de compras das empresas em relação a seus fornecedores - é sustentável?

  8. E cobrar a mais só porque o produto é "orgânico", "ecológico" ou "sustentável", restringindo seu acesso a uma pequena parcela da população - é sustentável?

  9. Criar novas cadeias de auditagem e certificação e contabilização da sustentabilidade, complicando e encarecendo os processos produtivos e tornando-se inacessíveis a pequenos produtores - é sustentável?
  10. Veicular campanhas publicitárias que reforçam estereótipos e preconceitos, degradam a condição humana, estimulam o consumismo e camuflam a verdade - é sustentável?
  11. Criar sachê para reduzir embalagens e depois mudar o tamanho do sachê - é sustentável?
  12. Criar embalagem sobre embalagem como forma de diferenciação de produto - é sustentável?
  13. Privatizar os lucros e socializar o prejuízo, como acabou de acontecer com a última crise econômica - é sustentável?

  14. Reduzir o IPI para carros novos - é sustentável?
  15. Não cobrar transporte público porque pode ter / manter um carro novo - é sustentável?

  16. Defender pedágio para diminuir o trânsito porque pode pagar o pedágio e esquecer-se dos que não podem - é sustentável?

  17. Jogar lixo na rua é sustentável?

  18. Abusar do banho e da troca de toalhas quando se está no hotel ("afinal, estou pagando") - é sustentável?
  19. Abster-se de qualquer manifestação ou pressão política, esquecer-se que somos seres políticos - é sustentável?

  20. Torcer para a Maya ficar com o Raj, reforçando a percepção de que a mulher deve submeter-se às tradições (e ao homem), é sustentável?

Que chuva, não?

Acredite: houve um tempo quando “que chuva, não?” era um bordão de um comercial de TV. Ironicamente, de uma companhia petrolífera, a Shell. Quem diria que três décadas e muita gasolina queimada depois esta inocente frase pudesse causar tanta apreensão, tensão e destruição! Morreu gente aqui em São Paulo e em Santa Catarina. Perto dessa notícia, o caos do trânsito e da telefonia ganha uma importância muito menor. Irresistível, portanto, falar de mudanças climáticas no dia de hoje aqui no blog. Ainda mais depois de ter assistido, na Globo, a um metereologista que admitiu que o número de catástrofes climáticas só tem aumentado nos últimos anos.

Não deixa de ser tentador jogar pedra na Shell, na Petrobrás, na Exxon/Texaco, na BP e acusá-las de responsáveis pela situação. Ou ainda acusar o governo de desgoverno – pela mudança na lei dos fretados, que ferrou o trânsito de São Paulo; pela falta de um sistema de transporte público decente; pelo incentivo ao transporte individual motorizado via uma isenção de IPI que só beneficia a indústria automotiva! Ou ainda ressaltar o caráter inédito do acontecido, completamente fora do padrão do clima de um final de inverno abaixo do trópico de Capricórnio! Tudo isso pode até ser verdade, mas só conseguimos explicar o dia de hoje se enxergarmos tudo ao mesmo tempo agora já –e com nossa anuência!

- Como assim?!!? Eu não dei licença com o que aconteceu hoje! Aliás, alguém dá ou deixa de dar licença a uma tormenta???

Pois é, parece irracional, mas é verdade: damos licença às tormentas. Abrimos as portas a elas. Estendemos tapete vermelho. A cada vez que incentivamos o uso do transporte individual motorizado (também conhecido como carro), seja por marcar reuniões para tratar de assuntos que podem perfeitamente ser resolvidos por telefone ou por não darmos alternativas a nossos colaboradores. A cada vez que desejamos comprar ações da Petrobrás. Ou que caímos do discurso pré-eleitoral do pré-sal. Ou que jogamos lixo na rua. Ou que não prestamos atenção em quem votamos. E deixamos de cobrar serviço do político no qual elegemos. Quando twitamos #forasarney mas não fazemos nada offline. Aliás, nem online: alguém mandou email de protesto para o senado? Para rádios e jornais e TVs? Alguém aí que fala inglês se lembrou de escrever prá ONU ou para o Banco Mundial pedindo mais rigor nos empréstimos ao Brasil, para que eles não financiem corrupção? Ou incríveis R$ 24 bilhões que serão usados para comprar submarinos e helicópteros militares? Aliás, você se indignou com essa compra? Ou achou normal destinar o dinheiro de nossos impostos para armas ao invés de educação e saúde – justamente num ano em que tantos morreram por não terem recebido o tal do Tamiflu?

Mas o que isso tem a ver com a chuva mesmo?? TUDO! Cada vez que terceirizamos a responsabilidade, confortavelmente depositando-a no ombro de outro (preferencialmente, um outro sem rosto, tipo “o governo” ou “o sistema”), abdicamos de nossa capacidade de construir um presente e um futuro mais dignos. Criamos as condições para que interesses setoriais se sobreponham aos interesses de todos. Achamos normais condutas impróprias porque, afinal de contas, nós também jogamos lixo nas ruas, não é verdade? Como se não andássemos nas ruas todos os dias... como se a rua não fosse nossa... como se o país não fosse nosso... E assim entupimos bueiros e sujamos os rios. Desviamos verbas públicas. Favorecemos amigos. Governamos de olho na governabilidade, e não na sustentabilidade. E assim ocupamos o vergonhoso posto de um dos maiores emissores de gás carbônico do mundo sem que nossa matriz energética seja suja – apenas com queimada da Amazônia e do Cerrado. Assim permitimos que áreas de risco sejam ocupadas por habitações que não oferecem segurança ou dignidade. E achamos normal. Parte da paisagem.

Seria tão bom se essa chuva lavasse nossos olhos e nos permitisse enxergar o outro, nos compadecer dele, perceber que estamos todos na mesma cidade, no mesmo país, no mesmo planeta. E, tendo ciência disso, começar a mudar de atitude. E cobrar mudanças dos outros também. Tudo ao mesmo tempo agora já. Que é a única maneira de lidar com tempestades.


PS - eu não achei o filme do Shell Responde sobre chuva ("que chuva, não?"), mas achei a pérola abaixo. Praticamente uma profecia
!

Filmografia básica de sustentabilidade: Uma Verdade Inconveniente

Filmografia básica de sustentabilidade: Uma Verdade Inconveniente, do Al Gore. O vídeo abaixo está em inglês. Não achei versão dublada / legendada na internet. Se souber de uma, me avise.

Uma boa notícia: empresa cria tecnologia que transforma CO2 em combustível

Gostou dos bichinhos da foto ao lado? Não, nada de nojo, por favor: eles podem vir a turbinar sua vida no futuro. Literalmente.

Graças a uma nova tecnologia chamada heliocultura, essas adoráveis criaturinhas transformam o CO2 da atmosfera em uma susbstãncia idêntica ao etanol. Sim, foi exatamente isso o que você leu: desenvolveram uma tecnologia que permite tranformar CO2 em energia!!! Para isso, elas são fixadas em painéis solares para absorver o gás carbônico do ar e captar a luz solar. Segundo os autores dessa proeza, a expectativa de produção inicial é de 75 mil litros por acre/ano já em 2011.

Esta maravilha tecnológica tem um nome digno de Organizações Tabajara: SolarConverter. A idéia do fabricante, a empresa Joule, é começar a fabricar em escala industrial os painéis SolarConverter no início de 2010. E olhem a ironia: para estabelecer suas produtoras de combustível, a Joule está procurando por locais ensolarados (ok) porém próximos a instalações que emitam grandes volumes de gás carbônico, como usinas termelétricas e produtores de cimento!!! Quem diria!!!

Bill Sims, CEO e presidente da Joule, explicou em nota publicada no blog Green Tech do site CNET que a produção do etanol de microorganismos é menos custosa, ocupa menos espaço e economiza água, uma vez que os microorganismos utilizados na fabricação do combustível são cultivados em água salgada ou descartada - ou seja, o povo do etanol de cana de açúcar tem que ficar de olho nessa história. Se ela der certo, ela tira a alegada competitividade do nosso produto. Estimativas da Joule indicam que um barril desse líquido custaria US$50, menos do que um barril de gasolina, que está custando aproximadamente US$70.

É esperar para ver no que vai dar. A exemplo de tantas outras notícias sobre tecnologias mirabolantes, pode ser que esta também não dê em nada e caia no esquecimento. Mas é bom acreditar que a tecnologia pode nos tirar da enrascada em que nos metemos. Eu não você, mas eu fiz uma opção de fé no ser humano. Torço, portanto, para essa história dar muito certo!!!

Lula abandona álcool e vira "maria gasolina"

A imagem aí do lado é da minha cidade, São Paulo. Não é filtro, nem photoshop: o ar fica efetivamente assim por causa da poluição gerada pelos carros. E na terra, fica todo mundo parado, por causa do trânsito... Tudo em nome da potentosa indústria automobilística e da ilibada Petrobrás! É tão óbvio que os interesses deles são mais importantes que o interesse da população em geral, né? Mas chega de ranhetices! Leia abaixo um delicioso texto do Bruno Blecher, do jornal Zero Hora, de Porto Alegre, postado em seu blog.


O mundo não é real, só pode ser uma grande piada. Em plena temporada do pré-sal, 14 entidades do agronegócio brasileiro criaram em São Paulo a Aliança Brasileira pelo Clima. A aliança reúne o pessoal da soja, das usinas de açúcar e de álcool, do papel e celulose, além das grandes tradings e indústrias de insumos, implementos e máquinas agrícolas. O principal objetivo deste grupo é influir nas negociações da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em dezembro próximo, na Dinamarca.

"Precisamos ser pró-ativos e ver a redução das emissões de carbono não como ameaça, mas como oportunidade. Há 35 anos temos uma matriz energética limpa com o uso do etanol", disse Marcos Jank, presidente da Unica, uma das entidades que forma a Aliança.
Beleza!, diria meu filho. Mas o grande garoto-propaganda do etanol brasileiro, que até há pouco tempo se gabava de ser presidente do país líder da produção de biocombustível limpo e renovável, virou "maria gasolina". Pois é, ele escapou de pegar a gripe suína do Uribe durante o encontro da Unasul, mas foi atacado pela febre do petróleo.
Tudo bem. O Brasil não pode se dar ao luxo de rasgar dinheiro. Tem que explorar toda a riqueza do pré-sal, ainda que produzindo um dos combustíveis que mais prejudica o ambiente e a saúde humana. A gasolina emite 90% a mais de gases efeito estufa do que o etanol da cana. Aqui em São Paulo, nesta época de inverno, dá para sentir na pele os efeitos nocivos dos combustíveis fósseis. Basta uma semana sem chuvas para que o ar se torne irrespirável.
Hoje mesmo a Folha traz um estudo do Ministério do Meio Ambiente mostrando que houve um aumento de 56% das emissões de gás carbônico no setor de transporte nos últimos 13 anos. Não é por menos. Usamos o diesel mais sujo do Planeta, sem contar que o governo reduziu este ano os impostos sobre os automóveis.
Às vésperas da COP-15, a convenção do clima em Copenhagen, O Brasil não deve abandonar a bandeira dos biocombustíveis, até pouco há tempo carregada com orgulho e pompa pelo presidente Lula. Uma boa parte dos lucros do petróleo do pré-sal deveria ser aplicada em pesquisa e desenvolvimento de energias alternativas. É uma forma de o Brasil chegar com mais moral em Copenhagen e assumir um papel de liderança das negociações, como o país que tem a matriz energética mais limpa do mundo.
“Vejo com indignação que muitos dos dedos que apontam contra a energia limpa dos biocombustíveis estão sujos de óleo e carvão”, disse o presidente Lula, não faz um ano, numa conferência da FAO em Roma, quando se acusava injustamente o etanol de ser um dos responsáveis pela forte alta dos preços dos alimentos.

O pré-sal pode ser um grande presente ao Brasil, mas como toda a herança precisa ser usado com sabedoria e generosidade, para não virar maldição. Países ricos em petróleo geralmente são miseráveis em civilização.

Você compraria uma garrafa de água suja?

Uma das melhores campanhas que já vi: chama a atenção para a causa, muda a percepção do público-alvo, mobiliza e consegue adesões. Tudo a partir de uma premissa simples: apresentar como um fato "normal" da classe média algo que afeta milhões de pessoas carentes em todo o mundo.

Você compraria água suja para beber?

Inversão de papéis

Sincronicidade é isso aí: ontem escrevi que as empresas, por meio da responsabilidade social, estão absorvendo questões que são do âmbito do governo e este, por sua vez, está cada vez mais protagonizando os rumos da economia pós-crise e eis que hoje durante uma palestra do Centro de Excelência em Varejo da FGV-EAESP eu me deparo exatamente com esse tema!

Foi durante a apresentação de Fabian Echegaray, da Market Analysis. Sua apresentação detalhou a distância que existe entre o que as empresa entregam, no âmbito da Responsabilidade Social Empresarial, e o que os consumidores esperam: este é o espírito da pesquisa Monitor, realizada a cada dois anos, em 32 países. A última edição, de 2009, mostrou que em países do hemisfério norte, os consumidores preocupam-se mais com questões operacionais, ou seja, o impacto da atividade empresarial sobre o meio ambiente, a garantia da sustentabilidade no processo produtivo, a aplicação dos mesmos padrões de sustentabilidade na matriz e nas filiais ao redor do mundo... Já nos países emergentes, a maior expectativa do consumidor é sobre a atuação social da empresa, isto é, sua contribuição para reduzir a violação de direitos humanos e a distância entre ricos e pobres, para resolver problemas sociais e para apoiar políticas e leis favoráveis à maioria da população. Curiosamente, o item de maior preocupação do consumidor das nações emergentes, Brasil incluído, é o apoio a projetos comunitários e de caridade.

Fico feliz de ter encontrado uma pesquisa que respalda o que até ontem era só um raciocínio, uma percepção intuitiva. Porém, fico preocupada ao perceber essa inversão de papéis. Inclusive porque uma empresa pode ser mais socialmente responsável fazendo seu serviço direito. Pegue, por exemplo, a Petrobrás: ela ajuda mais tirando o enxofre e o chumbo da gasolina e do diesel que polui o ar de nossas cidades ou com projetos culturais? Nada contra os projetos culturais, veja bem, mas e o negócio em si?? Deslocar o assunto para a esfera social é o caminho mais curto para deixar a operação fora da conversa.

Há que se lembrar também que, antes de mais nada, questões sociais são assunto de governo. É para isso que pagamos impostos: para ter saúde, educação, segurança, cidadania. Não podemos tirar essa responsabilidade do governo, sob pena de ter recursos mal aplicados ad infinitum. Sem contar que transferir a expectativa de tais questões para a iniciativa privada é caminho seguro para a frustração porque as empresas não gerenciam o aparelho do Estado, as instituições públicas, que são responsáveis por tais questões.

Mas de onde vem essa confusão? Foi o governo que a alimentou? Ou as empresas? Se elas inadvertidamente (ou não) deram a entender que poderiam contribuir para a solução desses pontos, deram um tiro no pé. Trabalhei mais de duas décadas com o mercado corporativo e por isso posso afiançar que má intenção e esperteza convivem com lisura e boas intenções. Então, não dá para acusar que houve má fé. Provavelmente foi ingenuidade de quem fez a comunicação do que a empresa realmente pode fazer. Tipo a propaganda da Coca-Cola que diz que "Toda vez que você bebe Coca-Cola, você contribui para melhorar a sua comunidade”. Só que agora existe uma demanda da sociedade, que quer a eficiência empresarial a serviço do social. Como resolver? E como deslocar a demanda para quem de direito, ou seja, o Governo?

Como diria TSElliot, between the intention and the action, falls the shadow...
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